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Entrevista com R.T. Kendall

Publicado em: 25/02/2016 por CBN-SP

R. T. Kendall

O pastor norte-americano Robert Tillman Kendall é um dos mais entusiastas pregadores do avivamento espiritual na atualidade. E ninguém pense que sua ênfase nos dons carismáticos é fruto de uma formação pentecostal apaixonada – teólogo reformado, egresso de escolas batistas e com doutorado em Filosofia, ele conta que teve uma experiência pessoal com o Espírito Santo há sessenta anos. Desde então, R.T. Kendall, como é conhecido mundialmente, pastoreou igrejas, produziu obras de referência e pregou o Evangelho – inclusive, na célebre Capela de Westminster, em Londres, onde foi ministro titular de 1977 a 2002. Ali, sucedeu no púlpito a ninguém menos do que o pregador britânico Martin Lloyd-Jones, um dos grandes nomes da fé evangélica no século 20. Dele, herdou o zelo pela Palavra de Deus e a paixão pela pregação expositiva, além do rigor na ortodoxia da mensagem. Aos 80 anos de idade, Kendall continua em plena atividade intelectual e ministerial. Seu livro Fogo santo (Faz Chover Produções), lançado recentemente no Brasil, faz uma análise esclarecedora e equilibrada sobre a contemporaneidade dos dons espirituais. O livro é um contraponto à obra Fogo estranho, do pregador batista John MacArthur, opositor declarado de Kendall. “Ele é uma espécie de disco quebrado. Eu não gostaria de estar em seu lugar, dadas as coisas horríveis que ele diz sobre tantas pessoas cheias do Espírito”, devolve. No Brasil pela primeira vez em setembro, Kendall, concedeu esta entrevista exclusiva a Cristianismo Hoje.

CRISTIANISMO HOJE – Nunca é fácil substituir uma celebridade. Como foi, para o senhor, ocupar por 25 anos o púlpito que foi de Martyn Lloyd-Jones?

R.T. KENDALL – Não foi fácil, com certeza. Porém, Lloyd-Jones era o meu maior incentivador, além de ser um grande amigo. Ele desejava, mais do que qualquer pessoa, que eu fosse bem sucedido. Foi ele, portanto, quem mais me ajudou, colocando-me naquela posição e abrindo a sua própria casa para mim.

O senhor encontrou alguma resistência da congregação ao substituí-lo?

Não havia nenhuma dúvida ou queixa por parte da congregação, apenas de algumas pessoas de fora que, por algum motivo, não queriam que eu fosse pastor de lá. Eu apenas me esforcei para ser fiel na pregação da Palavra a cada semana. Ele me ensinou a compreender o texto em si – em outras palavras, a não atribuir um conceito ao texto, mas sim pregar aquilo que ele exige.

Em seus livros, o senhor insiste na importância da mensagem expositiva da Palavra de Deus. Qual é o valor desse tipo de pregação para a Igreja contemporânea e por que a abordagem direta das Escrituras está perdendo espaço?

Não há nada melhor do que um bom expositor da Bíblia e nada pior do que um ruim. Por mais que desejemos, nem todo pregador apresenta as Escrituras de forma expositiva. Há, no entanto, grandes pastores que não pregavam dessa maneira. Quando me tornei ministro da Capela de Westminster em 1977, eu já me sentia à vontade com esse tipo de pregação, e a congregação estava acostumada a isso. A maioria das igrejas não valoriza tanto esse tipo de pregação – e essa perda de espaço à qual você se referiu talvez aconteça porque poucos são bons nisso e porque muitas igrejas não possuem um apetite teológico por esse tipo de pregação. Chegou o tempo em que os ouvidos das pessoas “coçam” por ouvir aquilo que desejam dos pregadores – como a teologia da prosperidade, por exemplo, que incentiva as pessoas a fixarem seus olhos no dinheiro e em questões financeiras. Eu acredito que estamos vivendo nos últimos dias, em que há uma forma de santidade sem o verdadeiro poder do Espírito Santo. O que temos como consequência disso é uma igreja adormecida – exatamente como Jesus profetizou na parábola das dez virgens. Esses pregadores não falam nada sobre o pecado, a condenação eterna e a vida de santidade.

Quais são os maiores perigos que esses pregadores representam para suas congregações?

Em primeiro lugar, eles desviam as pessoas da mensagem do Evangelho. O Evangelho é o principal, o mais importante: a razão de Deus ter mandado seu Filho para morrer em uma cruz, ou seja, para que possamos ir para o céu, e não para o inferno. Em segundo lugar, eles evitam que as pessoas se fortaleçam em Deus somente, através da leitura da Bíblia e do consolo do Espírito Santo. As pessoas, normalmente, não conhecem as Escrituras. Em terceiro lugar, nós sabemos que a Bíblia é a Palavra de Deus através do testemunho interno do Espírito Santo. Em quarto, eles impedem que as pessoas ouçam a pregação da Palavra de Deus. Eu receio que esses pastores-terapeutas não sejam pregadores de verdade, mas sim, uma espécie de psicólogos que abordam os desejos, e não as necessidades do povo de Deus.

Em sua opinião, quais são os principais argumentos doutrinais e teológicos que provam a continuidade das manifestações espirituais nos dias de hoje, ao contrário do que dizem os cessacionistas?

O cessacionismo, crença de que os dons do Espírito cessaram com o fim da Igreja primitiva, é uma hipótese. Aqueles que escolhem crer nessa hipótese o fazem não porque ela é bíblica, mas porque oferece pretextos para que eles não creiam nos dons espirituais. Não existe uma única palavra nas Escrituras que dê respaldo ao cessacionismo. Jesus Cristo é o mesmo ontem, hoje e para sempre, conforme Hebreus 13.8. Da mesma forma, o Espírito Santo é o mesmo ontem, hoje e para sempre. Qualquer pessoa imparcial que esteja disposta a seguir as evidências sabe que os milagres continuam acontecendo nos dias de hoje. Leia o trabalho de Craig Keener sobre milagres. Acompanhe o ministério de Randy Clark e as missões de Heidi Baker em Moçambique. Eu prevejo que, em um curto período de tempo, a hipótese cessacionista estará extinta no meio cristão, permanecendo apenas entre os ateus. Trata-se, na verdade, de deísmo com roupagens evangélicas. Ele está a um passo da descrença absoluta em Deus.

No Brasil, a demonstração excessiva de supostas manifestações espirituais, muitas vezes simuladas com objetivos fraudulentos, provocou um ceticismo generalizado – dentro e fora da igreja – em relação à autenticidade de dons como o falar em línguas e as profecias. Biblicamente, como seria possível identificar uma manifestação verdadeira do Espírito Santo?

Eu não estou qualificado para falar sobre a situação do Brasil, mas suspeito de que seja muito parecida com a que ocorre nos EUA em relação a alegações de curas falsas. Moisés descobriu, através de Faraó, que Satanás é capaz de produzir falsos milagres. Da mesma forma há, nos dias de hoje, charlatães que fazem o mesmo, prejudicando a imagem de homens e mulheres de Deus. Jonathan Edwards ensinava que, quando a igreja é reavivada, o diabo também é. Não deveríamos nos surpreender com a existência de falsos mestres e falsas profecias. Qualquer profecia que não seja coerente com a Palavra de Deus deve ser considerada falsa. E qualquer manifestação do Espírito que não leve à convicção do pecado, a uma vida de santidade e à glória de Deus deve ser vista como falsa.

A capacidade de falar em línguas é um sinal bíblico do revestimento de poder, como defendem os pentecostais?

Eu não acredito que isso seja evidência do batismo no Espírito Santo. O batismo no Espírito é a maior forma de garantia. É o que faz Deus e a salvação reais para as pessoas. O batismo no Espírito Santo é a porta de entrada para os dons espirituais e, também, para os frutos do Espírito. Os pentecostais têm a tendência de enfatizar os dons; os chamados protestantes tradicionais, os frutos. Nós precisamos dos dois – igualmente. Os dons do Espírito são irrevogáveis, conforme Romanos 11.29, ao passo que os frutos do Espírito não podem ser separados da nossa conduta ou das nossas atitudes pessoais.

O movimento pentecostal moderno teve origem com um grupo de pessoas sem formação teológica, espalhando-se dos EUA para o resto do mundo. Aqui no Brasil, ele foi identificado, durante muito tempo, com pessoas mais pobres e sem muita formação escolar. Em sua opinião, essa identificação social do movimento pentecostal com os pobres ainda existe?

Nunca devemos esquecer de que, na Igreja primitiva, Pedro e João não tinham uma educação formal, mas eles haviam estado com Jesus (Atos 4.13). Eu preferiria me juntar a gente assim do que a pessoas altamente educadas, mas que conhecem pouco do poder do Espírito. Eu incentivaria todas as pessoas a estudarem o máximo possível, contanto que isso não comprometa a autoridade e a infalibilidade da Bíblia para elas. Eu adquiri a minha formação através de um seminário bastante liberal, mas saí de lá mais forte do que quando entrei. Porém, também conheço muitas pessoas que abandonam sua fé quando expostas a duras críticas sobre as Escrituras e quando estudam filosofia moderna. Eu preferiria um milhão de vezes que tais pessoas fossem incultas, porém crentes na Palavra, do que tivessem doutorado mas se sentissem sofisticadas demais para falar em línguas. Nós precisamos de Pedro e João, mas também precisamos do apóstolo Paulo. Eu quero aprender o tempo todo, mas sem perder a capacidade de reconhecer a verdade. A maturidade teológica consiste, em parte, em saber que você ainda não a alcançou e que você estará sempre em busca da vontade e da glória de Deus.

O recente episódio em que o pastor John MacArthur foi confrontado no púlpito de sua igreja por um homem que se auto intitulou “profeta de Deus” e o criticou duramente por pregar o cessacionismo ganhou destaque no mundo inteiro. Para o senhor, o que motivou aquela atitude?

Eu achei esse incidente constrangedor. Aquele suposto profeta estava certo em sua posição doutrinária, porém errado na maneira como o abordou. Acho que, apesar da falta de sabedoria mostrada, Deus pode estar por trás disso, já que ele escolhe as coisas tolas deste mundo para confundir as sábias. Eu, no entanto, temo que o pastor a quem você se refere tenha se tornado incorrigível.

Quais são, em sua visão, os principais equívocos do livro Fogo estranho, de MacArthur?

Meu editor pediu que eu respondesse MacArthur. Eu só li Fogo estranho depois que meu livro já estava pronto; portanto, precisei escrever com base apenas no que imaginei que ele teria dito. Eu fiquei nervoso ao ler o seu livro por medo de ter deixado alguma coisa de fora. Quando, porém, o li, fiquei muito aliviado; eu não mudaria uma única palavra do meu livro. Eu acho que o autor de Fogo estranho é uma espécie de disco quebrado. Essa é a sua terceira tentativa de atacar os carismáticos. Ele está devendo muitas respostas; eu não gostaria de estar em seu lugar, dadas as coisas horríveis que ele diz sobre tantas pessoas cheias do Espírito. Um dos maiores equívocos do livro de MacArthur é que ele alega que o meu antecessor, o doutor Lloyd-Jones, concorda com ele nessa questão. Nada poderia estar mais distante da verdade. Eu dediquei um capítulo do meu livro à opinião de Lloyd-Jones a respeito do Espírito Santo. Eu acho que não devo aprofundar mais a minha resposta neste momento.

Como é a sua relação com o pastor John MacArthur?

Eu estive com ele apenas uma vez, no Texas, muitos anos atrás, quando pregamos na mesma conferência. Eu gostaria de ter desenvolvido um relacionamento com ele, mas ele parecia não querer o mesmo. Mas, ainda assim, eu espero que um dia ele responda à minha carta. Eu o respeito como mestre ortodoxo da Bíblia e acredito em muitas coisas sobre as quais ele prega. Não existe nenhum tipo de antagonismo pessoal entre nós – pelo menos, não de minha parte. Nós ainda teremos uma boa amizade no céu.

Neste momento da sua vida e ministério, quais são as tentações que o senhor enfrenta?

Eu estou com 80 anos. Porém, sendo totalmente sincero, as minhas tentações são as mesmas de cinquenta anos atrás – e se resumem a três coisas: dinheiro, sexo e poder. O amor ao dinheiro é a origem de todo o mal. Devemos ser completamente honestos quando se trata de dinheiro. Eu preciso estar disposto a permitir que qualquer pessoa veja quanto dinheiro entra em meu ministério e como cada centavo é gasto. Quanto ao sexo, todo cuidado é pouco em relação ao sexo oposto. Parece que o diabo consegue 75% dos melhores servos de Deus devido à falta de pureza sexual. É uma pena. Que tristeza! Já o poder refere-se principalmente ao orgulho – ou seja, pessoas que desejam o controle para construir impérios, ficar famosas. O melhor antídoto para essas três coisas é nos lembrarmos constantemente de que todos nós, em breve, estaremos diante do tribunal de Cristo para prestarmos conta das obras praticadas no corpo, quer sejam boas, quer sejam más (II Coríntios 5.10). Esse versículo é um lembrete amargo de que tudo o que for praticado em segredo será revelado. Isso deve ser o suficiente para que sejamos cuidadosos quando se trata de dinheiro, sexo e poder.

Que conselhos o senhor daria aos jovens pastores de hoje a respeito do uso equilibrado dos dons espirituais?

Diria uma única coisa: Enfatize os frutos do Espírito, conforme Paulo recomendou aos crentes de Éfeso. Porém, se nós tivéssemos que fazer uma escolha, a demonstração de perdão e a oração pelos nossos inimigos são mais importantes do que fazer as pessoas acreditarem nos dons do Espírito.

Por Marcos Simas / Cristianismo Hoje.

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